sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Explorar o altruísmo das pessoas estúpidas


Há uns meses tive que ir ao IPO. Foi a primeira vez que entrei naquele sítio (e até agora a única) e estava distraído à procura da sala onde tinha que ir. Fui parado por uma rapariga com cerca de 12 anos que se colocou à minha frente e me estendeu um papel para eu assinar.

E eu assinei imediatamente.

Primeiro porque o IPO é daqueles sítios onde é muito difícil uma pessoa ser uma besta. Por causa da circunstância em que estão a maior parte das pessoas que lá têm que ir há uma necessidade acrescida de sermos prestáveis.

"Precisam da minha assinatura? Aqui está ela. É preciso mais alguma coisa? Um cafézinho? Uma massagem nas costas? Um órgão? Só estou aqui para ajudar!"

As pessoas que estão no IPO ou têm cancro ou são familiares de alguém com cancro ou estão a ajudar pessoas com cancro. São autênticos heróis. Quem sou eu para recusar uma assinatura num papel que não li a uma rapariga com idade de estar na escola àquela hora?

Segundo, porque eu assino qualquer coisa que me ponham à frente. O sentimento de importância gerado pelo facto de alguém precisar da minha assinatura é mais forte do que eu. Estendam-me um papel que eu assino: autógrafos, petições, testamentos ou certidões em que deixo todos os meus bens terrenos a príncipes nigerianos (espero que Sua Alteza aprecie todos aqueles livros que comprei só porque estavam com desconto!).

Às pessoas que me pedem assinaturas para o que quer que seja só tenho uma coisa a dizer: Obrigado pela vossa não indiferença! Assinar um papel é uma maneira formal de dizer "eu assino, logo existo" e existir é o que andamos todos a fazer aqui, não é? A resposta simplificada a todas as questões que colocamos sobre a nossa existência (Quem sou eu? o que estou aqui a fazer? Para onde vou?) é dada quando assinamos um papel. Em síntese, somos aquilo que assinamos. Pelo menos naquele momento e naquele espaço, estamos e existimos.

(acho que não preciso de admitir que esta filosofia de treta é apenas uma forma inútil de tentar justificar a estupidez do meu acto de assinar um papel que me puseram à frente)

Reparei que a adolescente que me parou era surda. Não lhe fiz nenhum exame, deduzi isto porque só gesticulava. E no cabeçalho do papel que ela me apresentou havia referência a uma associação de surdos. Por isso presumi que era para ajudar essa causa.

Assinei o meu nome. Coloquei o meu e-mail (o do spam, claro!). E estava a acabar de escrever a minha morada (sim, eu escrevi a minha morada naquele papel! Porque a morada é aquele dado que se dá com esta facilidade!). Até que no campo seguinte, que dizia donativo, percebi que me estavam a pedir dinheiro. E as pessoas que tinham assinado antes de mim (partindo do princípio que alguém assinou antes de mim) tinham dado todas para cima de 20€.

E foi aí que as peças começaram a juntar-se na minha cabeça. Percebi que aquilo se calhar era um esquema. Que qualquer pessoa pode imprimir um papel com uma tabela e com o cabeçalho de uma associação inventada. Que a rapariga provavelmente não era surda. E depois deste momento Sherlock Holmes com um atraso mental decidi que não ia dar dinheiro àquela associação. Muito menos os 20€ necessários para não me sentir culpado em relação às pessoas inventadas que assinaram antes de mim.

E comecei a tentar explicar à rapariga "surda", através de língua gestual improvisada, que não tinha dinheiro. E que melhor maneira de explicar que não se tem dinheiro a uma pessoa que anda metida nestes esquemas do que tirar a carteira e apontar para ela?

"Vês? Não me vais conseguir sacar dinheiro através deste esquema. Mas está aqui a minha carteira, caso o teu colega carteirista esteja por perto a vigiar. Deve ter informação suficiente para me poderem roubar a identidade. E algum dinheiro também. Já levas a minha morada e tudo. Já deves ter percebido que eu sou ESTÚPIDO. Queres mais alguma coisa?"

Foi só mais uma jogada de génio da minha parte. Tive a sorte de ser salvo por um senhor que me puxou, me explicou o esquema e me levou ao sítio onde tinha que ir. Achei nojenta a ideia de ir para o IPO fazer este tipo de coisas, mas assumo também a culpa de ter sido um patinho. E até merecia ser roubado pela minha estupidez. Podemos culpar a vítima quando somos a vítima, certo?

Lembrei-me desta história porque ontem estava num restaurante e entrou lá um senhor que pousou em todas as mesas um papel em que era pedida ajuda monetária para ajudar nas despesas de saúde de uma criança inexistente (tinha a foto dessa criança entubada e tudo). Ninguém lhe deu dinheiro.

Tudo isto são esquemas utilizados pela mesma rede: explorar a empatia das pessoas por surdos ou por crianças doentes para sacar algum. A questão é que já não resulta. Mais vale pedirem dinheiro directamente ou usarem pretextos como a venda de pensos ou a arrumação de um carro num estacionamento. Ninguém vai acreditar que estão a correr todos os restaurantes da cidade para financiar os tratamentos de uma criança doente. Mais valia colocarem à nossa frente um papel: "Caso não tenha percebido, estou a pedir dinheiro. Preciso dele." em vez de nos fazerem insultar dentro da nossa cabeça a fotografia de uma criança entubada desconhecida.

E sabe Deus como eu insultei aquela criança...

domingo, 26 de outubro de 2014

Princesas Disney

Tenho uma irmã de cinco anos (eu tenho 29 anos), por isso penso muito em princesas Disney. Compilei aqui algumas questões que me atormentam sobre o tema: 


 O romantismo dos príncipes Disney

A sorte do príncipe da história da Cinderela é que se apaixonou pela única pessoa a calçar aquele número em todo o Reino. Além disso, não consegue identificar a mulher da vida dele pela cara se ela estiver com roupa de pobre. Que tipo impecável! Roupa de pobre está para a Cinderela, como usar óculos está para o Super Homem.

Bastou ouvir a voz da Pequena Sereia para o príncipe se apaixonar. Teve sorte em ser correspondido e em não se ter apaixonado por um CD da Céline Dion.

Quando as mulheres dizem que estão à espera do seu Príncipe Encantado, o que elas querem dizer é que estão à espera de alguém que se apaixone por elas por motivos fúteis?


Princesas Disney e política

Desconheço a opinião das Princesas Disney sobre a governação dos Reinos cujo trono um dia vão herdar. Deviam preocupar-se um pouco mais com política e menos com gajos... O que é que vai fazer a Branca de Neve quando chegar ao poder? Vai pôr os animais a governar para poder continuar a cantar musiquinhas de 5 em 5 minutos?


  
A Subjectividade da beleza

Espelho mágico da Rainha Má, tinhas mesmo que espicaçar dessa maneira uma senhora psicopata com problemas de confiança? Não podias dizer a verdade, que a beleza é uma coisa subjectiva? Ou que, em termos de beleza, uma é o Messi e outra é o Ronaldo? Ou uma coisa mais javardola como "se não fosse a merda de um espelho bidimensional, comia as duas na boa"? Ainda por cima a Rainha Má até é bem jeitosa. Tenho a certeza que muita gente a consideraria a mais bela do Reino. Não precisavas de ser tão taxativo. Era só uma opinião. A Branca de Neve para quem aprecia miúdas de 14 anos também não está má. Mas da maneira que ela se atira ao primeiro príncipe que lhe aparece ou se enfia em camas de anões que não conhece de lado nenhum não chega aos 20 sem 3 cesarianas, alcoólica, viciada em anti-depressivos e a seguir o Tony Carreira para todo o lado. E a Rainha com as suas poções mágicas é bem capaz de chegar aos 60 ainda para as curvas.

Moral implícita da história: Muitos problemas que são resolvidos com caçadores podiam muito bem ser resolvidos com um bocadinho de bom senso.

O capitalismo das Lulas-vampiro, segundo Matt Taibbi



Título: Griftopia: Bubble Machines, Vampire Squids, and the Long Con That Is Breaking America

Autor: Matt Taibbi Editora: Spiegel & Grau

Data de Publicação: Novembro, 2010

Língua: Inglesa

“Griftopia: Bubble Machines, Vampire Squids, and the Long Con That Is Breaking America” (o que, em português, quer dizer qualquer coisa como “A Utopia dos Aldrabões: Máquinas de Bolhas, Lulas-vampiro, e a Grande Golpada que está a destruir a América”) é o último livro [1] do jornalista da secção de política da Rolling Stone, Matt Taibbi. Publicado em Novembro de 2010 pela Editora Spiegel & Grau, proporciona uma perspectiva arrojada e provocatória sobre as causas e os episódios que conduziram à crise financeira de 2008, assim como as suas consequências.

Matt Taibbi, que chegou a jogar basquetebol na liga da Mongólia, tem vindo a dedicar a sua atenção a Wall Street escrevendo artigos demolidores sobre o tema. E demolidores é dizer pouco. De facto, Matt Taibbi é um dos maiores críticos do clima de impunidade que se vive no sector financeiro e do impacto devastador que a “mão invisível” dos mercados tem na economia mundial. Mais do que relatos sobre o cinzento mundo da alta finança, as suas reportagens, ao bom estilo do jornalismo gonzo, parecem histórias de gangsters. Mas com algumas diferenças relevantes. Nestas histórias de gangsters, os mafiosos não só não são presos ou mortos em tiroteios, como recebem uma quantidade absurda de dinheiro dos contribuintes e são escolhidos por quem os devia punir para resolver os problemas que causaram. O que ao nível das verdadeiras histórias de gangsters é o equivalente a nomear Tony Soprano para Director do FBI ou Tony Montana para Ministro da Defesa.

Uma boa compreensão da actual crise socioeconómica não dispensa o recuo à crise financeira de 2007-2008, tarefa nada fácil, dada a complexidade do tema. Talvez por não ser formado em Economia, Matt Taibbi consegue explicar o funcionamento da fábrica de bolhas de Wall Street, todo o processo de desregulação da economia que levou à crise e as bases políticas para essas decisões, de um modo acessível, partindo sempre de casos concretos em que essas decisões afectam a vida do cidadão comum. A tónica do livro é predominantemente pessimista e faz-nos perceber que pouco mudou desde 2008 e o que mudou não foi para melhor: os bancos de investimento que provocaram a crise estão ainda mais poderosos e a população em geral está cada vez mais pobre. Se muitos esperavam um ressurgimento da esquerda e uma resposta keynesiana aos problemas criados por esta crise, o que aconteceu foi precisamente o contrário (austeridade, austeridade, austeridade e… austeridade). É pois um depoimento esclarecedor, sério e bem fundamentado que Matt Taibbi faz sobre a maior crise desde a Grande Depressão, uma realidade extremamente complexa que a maior parte das vezes é analisada segundo slogans enganosos e redutores como “vivemos acima das nossas possibilidades” ou “a culpa é do Estado Social” e gráficos do Medina Carreira.

Para além do interesse da história, o livro de Matt Taibbi distingue-se pela sua qualidade literária. O estilo de Taibbi é peculiar, de quem está verdadeiramente revoltado com o que aconteceu, recorrendo mesmo ao uso de palavrões ou insultos. Atribui, por exemplo, ao ex-Presidente da Reserva Federal Alan Greenspan o título de “Maior escroque, parvalhão, inútil, incompetente, mentecapto, oportunista, ectoplasma, baquibuzuque, espécie de estrato de ornitorrinco enlatado do Universo”. Na verdade Taibbi chama-lhe apenas “asshole” mas não quis perder esta oportunidade de, também eu, brindar o desprezível e vaidoso economista com alguns insultos em português. É difícil a incompetência, irresponsabilidade, desonestidade e preconceito ideológico deste político disfarçado de escriturário não despertar o lado Capitão Haddock que há em todos nós. Afinal foi ele o grande responsável político pelas medidas de desregulação do sistema financeiro implementadas desde que tomou posse como Presidente da Reserva Federal, ainda durante a administração Reagan. Como por exemplo a grande pressão que exerceu para impedir a regulação das derivativas (os complexos instrumentos matemáticos que foram utilizados para mascarar muitas das aldrabices levadas a cabo em Wall Street).

São constantes as referências à cultura pop ao longo de todo o livro (ou não se tratasse de um jornalista da Rolling Stone [2]) e apresenta um humor bastante apurado. Tudo isto sem que se possa pôr em causa a validade dos factos que relata, abordando questões como a filosofia perversa de Ayn Rand, a grande referência intelectual da direita americana e, porque não dizê-lo, dos neoliberais em geral, conhecida pela sua eloquente defesa do primado do individualismo e da ganância como qualidade necessária para a evolução da sociedade (uma espécie de homo psicopatis que, de maldade em maldade, nos leva a um paraíso sem estado e em que todos somos bestas egoístas, ainda que milionárias); da especulação em commodities e da transferência de recursos entre a economia real e o mundo financeiro que esta origina; da bolha do subprime; da forma absurda como o Tea Party falhou o alvo da sua contestação; dos aspectos criticáveis da reforma do Sistema de Saúde encetada pelo Presidente Obama e do papel da Goldman Sachs em quase tudo o que de mau se passa no Mundo.

Vale a pena salientar a questão da Goldman Sachs, pelo destaque que deu a Taibbi. Se hoje é opinião mainstream que a Goldman Sachs (escola que já formou gente tão ilustre como Dr. António Borges [3], Dr. Carlos Moedas, Hank Paulson, Lucas Papademos, Mario Draghi ou Mario Monti) é um ninho de bandidos e a imagem de quase tudo o que correu mal com este capitalismo, quando Matt Taibbi a descreveu de forma brilhante como “uma gigantesca lula-vampiro enrolada na cara da humanidade, com o seu funil de sangue implacavelmente chafurdando em busca de tudo o que possa cheirar a dinheiro” muitos economistas sérios saíram em defesa do famoso banco de investimento, assumindo-se ultrajados pelo insulto feito a uma instituição tão respeitada e que fez mais pelo Mundo do que a Cruz Vermelha, os Médicos Sem Fronteiras, a Greenpeace, o Homem Aranha e o Inspector Gadget todos juntos. Acontece que hoje o papel pernicioso da Goldman Sachs na economia é consensual (até os próprios o admitem e parecem apreciar a sua nova imagem de arqui-inimigos da decência) e a imagem da lula-vampiro colou-se de tal maneira à sua marca que é difícil alguém nos media norte-americanos referir-se à Goldman Sachs sem se lembrar desta brilhante metáfora. Ao ser dos primeiros a apontar o dedo à Goldman Sachs, Matt Taibbi conseguiu uma pequena vitória sobre o capitalismo selvagem, que o ajudou a posicionar-se como uma das mais importantes referências intelectuais do movimento Occupy Wall Street. O livro de Taibbi não está traduzido em português e tanto quanto sei não está previsto que saia em Portugal. No entanto, é possível adquiri-lo na sua versão original a um preço bastante acessível em qualquer livraria on line, quer em papel quer em ebook. Além disso, disponibilizo o meu exemplar do livro a todos os que manifestem interesse na sua leitura. Os seus artigos na Rolling Stone estão todos disponíveis gratuitamente no site desta revista (www.rollingstone.com) e o seu blogue é [4] frequentemente actualizado (http://www.rollingstone.com/politics/blogs/taibblog) [5].

[1] Depois da publicação deste texto, Matt Taibbi lançou o também interessante "The Divide: American Injustice in the Age of the Wealth Gap".
[2] Depois da publicação deste texto Matt Taibbi abandonou a Rolling Stone e está à frente da criação de uma nova revista on line centrada sobre o tema da corrupção financeira, inserida no grupo editorial First Look Media fundado por Glen Greenwald, Laura Poitras e Jeremy Scahill com o patrocínio do fundador do eBay Pierre Omidyar.
[3] Depois da publicação deste texto, António Borges morreu. Este tipo de pessoas também morre.
[4] Era...
[5]  Passou-se tanta coisa desde que este texto foi escrito. O tempo passa, as coisas mudam...

sexta-feira, 24 de outubro de 2014

7 dicas infalíveis para uma entrevista de emprego de sucesso


Está desempregado e não sabe porquê. Eu explico-lhe a razão: não seguiu estas dicas. Aprenda-as, aplique-as e consiga o emprego dos seus sonhos. Já!


 Seja excêntrico

Os empregadores querem alguém que se destaque. O que não faltam são pessoas convencionais que usam fato e gravata e que entregam CV's em papel. Procure destacar-se pela diferença. Leve um coador de esparguete na cabeça e procure referir sempre que possível a sua devoção pelo monstro do esparguete. Escreva o seu CV numa lápide de mármore e entregue-o com um carrinho de mão. Apareça todo nu como forma de provar que não tem tabus  (eles vão apreciar a honestidade).



Procure informar-se sobre a empresa

O básico que todas as pessoas convencionais fazem antes de uma entrevista é consultarem o site da empresa. Mas você não pode ser convencional. Tente ir mais longe. Procure saber TUDO sobre as pessoas que o vão entrevistar. Para isso, contrate detectives privados e, caso não tenha meios para tal, encete você próprio uma perseguição 24/24 sobre essas pessoas. Recolha todas as informações que conseguir. O empregador ficará agradado quando a meio da entrevista referir informações avulsas sobre a sua vida privada: nome dos filhos, cereais preferidos dos filhos, marca de papel higiénico, casos extra-conjugais, fetiches, etc. Depois desta prova de dedicação, não vão desperdiçar o talento de uma pessoa que pode saber informações comprometedoras sobre eles.




Seja genuíno

Os empregadores apreciam genuinidade. Por isso não se acanhe. Chore, esperneie, desabafe, insulte os seus inimigos, vomite, seja possuído por demónios... Mais do que pessoas que o estão a entrevistar, eles são seus amigos. Aproveite o momento para um pouco de psicoterapia. Eles vão apreciar.



Esteja bem-disposto

Porque foi por isso que Deus inventou as drogas. Quem é que gosta daquele amigo careta que recusa beber porque "tem que levar o carro em segurança"? Numa entrevista de emprego é a mesma coisa. Quem é que vai preferir o candidato choninhas sóbrio em detrimento do candidato bêbado que nem um cacho que se atira a toda a gente? Acho que a resposta é óbvia.


Seja dominante

Ninguém aprecia pessoas fracas. Mostre-se ambicioso e forte e não tenha vergonha de mostrar o seu perfil alfa. Diga coisas do género:

"Quando mandar em si, esmago-o que nem uma barata."

"Quando for o dono disto tudo, colocarei a cabeça de cada um dos meus inimigos à porta da empresa."

"Ao pé de mim, Átila, o Huno, era um pequeno pónei."

"Se já tirei vidas humanas? Não respondo."

"Normalmente, dou-me bem com toda a gente."


Mostre os seus talentos

Não tenha vergonha de mostrar aquilo em que é bom, mesmo que não tenha grande relação com a função em causa. Se o seu talento for malabarismo, sapateado, acrobacias de Segway, ventriloquismo, origami de pénis ou queimar insectos com lupa vá preparado para uma demonstração.





Mantenha uma boa postura corporal

Hoje em dia os empregadores procuram pessoas flexíveis. Faça alongamentos antes da entrevista para que a sua postura corporal mostre flexibilidade. Impressione os entrevistadores com espargatas, cambalhotas, mortais encarpados e simulações de todas as posições do Kamasutra com material de escritório. Seja o trabalhador flexível que eles procuram.

O Mundo é seu!

sexta-feira, 10 de outubro de 2014

Do casamento do Clooney à minha "relação" com Oliver Stone

O George Clooney casou-se. E, aparentemente, isso é um facto digno de ser noticiado nos telejornais portugueses e neste blog. Porque é importante. Quando vemos um filme do George Clooney é importante estarmos a par da vida privada dele. Não conseguimos apreciar devidamente o seu desempenho como árvore ou pirata se não soubermos com quem é que ele dorme.

O Clooney fechou Veneza para o seu casamento e eu fiquei aliviado por não ter sido convidado. Não sei qual é o mínimo que tem que se dar de prenda num casamento que implica o encerramento de uma cidade europeia de grande dimensão mas deve estar muito para além das minhas possibilidades. Mesmo em casamentos normais, duvido que aquilo que ofereço dê para pagar a quantidade de leitão que eu enfardo.

E nunca fui a um casamento em que fechassem uma cidade ou até uma freguesia! Os casamentos a que eu vou não implicam que as pessoas que moram à volta deixem de fazer a sua vida normal (excepto num casamento em que um tio meu bebeu tanto que começou a vandalizar a casa do vizinho, mas mesmo isto não se compara com o transtorno por que passaram os habitantes de Veneza).

Se chegasse àquele casamento com 100 euros em meu nome e da minha acompanhante para dar ao George não ia sentir-me à vontade para comer mais do que um camarão nas entradas. E ninguém vai a um casamento para passar fome. Por isso, mesmo que fosse convidado, provavelmente não iria.

Mas na verdade, nunca esperei ser convidado. Não sou como aquelas pessoas que ficam tristes quando as celebridades de quem são fãs se casam e felizes quando se divorciam.

O que é absurdo e torna ainda mais absurdo o tom com que estas "notícias" são dadas: "o solteirão mais cobiçado do mundo vai casar-se". Como quem diz "Lamento, minhas senhoras, o George já não está disponível. Reduziram drasticamente as hipóteses de (1) se cruzarem com ele no Lidl mais próximo da sua residência e (2) ele se apaixonar perdidamente por vocês. Mas a esperança é a última a morrer!".

Não, a esperança não é a última a morrer. A esperança deve morrer num prazo razoável (por exemplo, bem antes de decidirmos aparecer em frente de um júri que avalia o nosso talento inexistente para as cantorias). Para quem gosta de números, deve ser a 47.ª coisa a morrer. Se morrerem 46 coisas e continuarmos a ter esperança, é porque vivemos num Mundo de fantasia e convivemos bem com 46 cadáveres à nossa volta. O que não são características aceitáveis num ser humano decente. Vão ter uma vida mais tranquila se aceitarem o simples facto de que a esperança não é a última a morrer e de que dificilmente vão casar-se com uma estrela de Hollywood.

Para dar um exemplo, o mais próximo que eu estive de uma estrela de Hollywood foi na sexta feira (26 de Setembro), quando o realizador Oliver Stone veio dar uma conferência a dois passos de minha casa, literalmente. Se eu estivesse a tentar seduzi-lo seria a minha janela de oportunidade. Mudava a minha vida. Casava-me com um grande realizador de Hollywood com uma certa idade, tinha hipótese de entrar em alguns filmes e, em pouco tempo, herdava uns milhões de euros.

Por mais que eu estivesse determinado em ser o gold digger do Oliver Stone (não estava!), havia demasiados obstáculos para o engatar naquele contexto. Primeiro, nem eu, nem ele somos gays. Uma relação, por mais interesseira que seja, dificilmente funcionará nestes moldes. Segundo, antes de olhar para mim, mesmo naquela sala quase vazia, havia pessoas muito mais interessantes do que eu (o presidente da Câmara do Porto, por exemplo). Terceiro, não havia a mínima hipótese de falar com ele o tempo suficiente para qualquer pick up line fazer efeito. O Presidente da Câmara do Porto Rui Moreira esteve bem mais perto de o engatar do que eu. E, que eu saiba, também não conseguiu. Se conseguisse, não se falava de outra coisa neste país.

É esquisito que eu esteja a pôr a hipótese de engatar o Oliver Stone porque mesmo que naquele momento todas as pessoas do Mundo desaparecessem e eu ficasse sozinho neste planeta com o Oliver Stone jamais teria uma relação amorosa com ele. É que nem o argumento da continuação da espécie se aplica neste caso. Podíamos tornar-nos amigos, mas não mais do que isso. O momento em que eu me visse sozinho no Mundo com um sexagenário seria o momento em que eu me tornaria celibatário. Arrumava de vez com a ideia de voltar a fazer sexo.

Esta história pode parecer ridícula (e é), mas é ilustradora das probabilidades de uma pessoa normal vir a ter um relacionamento com uma estrela de Hollywood. A vida não é uma comédia romântica e a Julia Roberts não vai entrar na nossa livraria de bairro.

E acho que vou parar esta estupidez por aqui.